Nunca é tarde para fazer o que você quer, só que, às vezes, é, sim
Ou por que a ideia de sempre poder começar adia o começo
Eu sempre fui fã daquela máxima de que nunca é tarde para começar a fazer as coisas. Dá para começar uma faculdade depois dos 30, abrir um negócio com 40, mudar de cidade com 50, e por aí vai. Sempre incentivei amigos e familiares nesse sentido, nunca subestimando seus desejos de tentar algo novo. No entanto, fiquei pensando que essa ideia de que sempre é possível começar em qualquer ponto da vida pode, paradoxalmente, ser meio paralisante. Se você pode começar agora ou daqui a dois anos, ou daqui a dez, por que começar agora?
O agora nunca parece um bom momento.
Sabe como é? Você sempre queria fazer outras coisas antes. E ainda falta mais estabilidade para fazer uma mudança grande. A gente sempre acha que ainda não tá pronto, mas em algum momento vai estar. E tá tudo bem, porque você sempre vai poder começar, né? Não tem problema ser mais tarde. Agora eu vou te dizer uma coisa que eu não gostaria de dizer e você não gostaria de ouvir: tem problema, sim.
Meu ponto não é te paralisar pelo tempo que passou. Não é fazer você achar que já devia ter começado e agora nem vale a pena tentar. Meu ponto é que se a gente começa a adiar demais as coisas, elas simplesmente não acontecem. Tem coisas que dá para começar em qualquer ponto da vida, é verdade — e que bom! —mas outras, não. E a escolha de quando começar pode não só fazer diferença no resultado, mas no nível de esforço que você vai fazer. Você pode começar mais tarde, sim, mas isso pode ser mais difícil.
A verdade é que a gente nunca se sente pronto para nada. E se for esperar por isso, vai esperar sentado. Esse momento ideal que você tá esperando não existe.
Quanto mais adia, maior o esforço?
Vou dar três exemplos do que eu estou falando, mas tantas outras situações seriam possíveis de enquadrar aqui: aprender uma nova língua, dirigir e ter filhos. Essas são três coisas que se você tem o desejo de fazer — e, pelo amor de Deus, não estou pregando que você tem que fazer nada que não seja SEU desejo, ok? — você tem um custo maior se fica adiando.
Eu tenho 35 anos e ainda não sei dirigir. Eu já tive oportunidades para tirar carteira, mas nunca tive a iniciativa, realmente. Dizia para mim mesma que isso não era prioridade, que eu não precisava de um carro na minha rotina da época, que eu não tinha dinheiro para comprar um carro mesmo, que autoescola era chato e caro, que eu andava muito bem de ônibus, que Uber valia mais a pena, que um dia eu ia resolver isso. E nunca resolvi.
Agora, penso que quero realmente aprender a dirigir, mas o custo disso provavelmente será muito maior do que se eu tivesse tirado a carteira aos 18 ou aos 25. Eu já tenho uma carga de medo e falta de confiança com isso acumulada durante muitos anos. Eu tenho muito menos tempo para me dedicar a isso agora do que já tive antes.
Isso quer dizer que eu devia deixar para lá porque o timing já passou? Não. Isso quer dizer que eu tenho que parar de enrolar e começar o quanto antes. O mesmo vale aqui para aprender um idioma: vai ficando mais difícil com a idade mesmo. A gente precisa de um pouco mais de dedicação quando começa mais velho. Quer dizer que é melhor não fazer um curso? Não! Quer dizer que se você adiou até agora, tá na hora de parar de adiar.
E, enfim, o exemplo sobre ter filhos. Esse realmente tem um timing se você deseja uma parentalidade biológica, né? Você pode ter filhos mais tarde, claro, graças aos avanços da ciência reprodutiva, etc. Mas isso tem um teto e terá um custo. E não estou falando só do custo financeiro — que já é muito alto —, mas do físico e mental também. Isso quer dizer que se você já tem 40 e não teve filhos, já era? Claro que não. Quer dizer que se você realmente deseja isso e tem como, a hora é agora. O momento ideal não está lá na frente.
Meu ponto é que você pode começar a qualquer momento, sim, mas se você puder, você deve começar é AGORA. O tempo vai passar do mesmo jeito se você começar o seu plano agora ou não. Daqui a cinco anos, você pode estar com isso andando ou resolvido ou pode estar aqui ainda pensando no “e se?” ou no “e quando?”.
Nosso tempo é finito mesmo! Não deixe ele passar sem ir atrás do que você deseja.
E isso talvez seja uma promessa de que aos 35 anos eu vou tirar a minha carteira de motorista.
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Quer ler mais coisas legais? Aqui vão alguns textos que eu gostei nos últimos tempos:
“mudar é desconfortável, mas não mudar é insuportável”, da newsletter Vida em Itálico;
“Nós, os desertores de classe”, da newsletter Nó na Cabeça;
“Meditations for Phone Addicts”, em inglês, da newsletter Dostoevsky‘s blog.
“Existe um cérebro normal?”, da newsletter Muito Além do Cérebro
Já indiquei aqui no passado o livro que me introduziu ao escritor francês Édouard Louis, “Quem matou meu pai”. Se você gostou desse livro, provavelmente também irá gostar do brasileiro “O que é meu”, de José Henrique Bortoluci.
Também uma obra de auto ficção, o livro muito bem escrito retrata a história do pai caminhoneiro de José Henrique, que percorre o Brasil a partir do interior de São Paulo. O autor aborda o câncer de intestino do pai e como a doença se desenvolve ao mesmo tempo em que conta suas histórias de estrada, que são ilustrações de histórias do país. Outro tema que perpassa o livro e é um paralelo com a escrita de Édouard Louis é a ascensão social do filho por meio do estudo e as dificuldades de comunicação e pertencimento que isso gera.
Por hoje é só! Até semana que vem!
Leia também:
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É isso. Tem até aquele meme do "primeiro vc começa,depois vc melhora". É meio isso. Só dá pra melhorar o que a gente começou, o que tá só na cabeça não é nada...e ter isso em mente tb de que vc pode tentar e descobrir que não é pra vc, o que é melhor do que nunca descobrir.
Sim! Já assisti algumas pessoas bem-sucedidas respondendo à típica pergunta "o que você acha importante dizer pra quem tá começando?". As melhores respostas, na minha opinião, foram do tipo "Comece agora com o que você tem e do jeito que der, sem perfeccionismo".
É libertador pensar que você pode começar e ser ruim, dar errado, reavaliar, etc. Você pode começar e descobrir que não era pra você mesmo, aí deixar pra lá e ter um "e se" a menos. Você pode começar e descobrir vários aspectos inesperados da atividade, e começar a se adaptar a eles ou até gostar deles.